As casas da Fajã Grande na década de cinquenta
Na década de cinquenta do século passado, as casas da Fajã Grande, sobretudo as das famílias menos remediadas, eram muito simples e pobres. Embora já todas fossem cobertas de telha, o que não acontecia no final do século XIX, muitas ainda eram de chão térreo, sobretudo as cozinhas. Limitavam-se a quatro paredes grossas e toscas, a um tamanho muito escasso e com altura apenas suficiente para conter uma porta por onde passasse um homem alto sem se curvar muito. Os tectos eram de telha canelada sobre uma armação de madeira, com a porta traseira da cozinha a ser a principal e a mais utilizada.
Apesar de pequenas, a maioria dessas casas albergava mais de uma dezena de pessoas, incluindo o pai, a mãe, mais de meia dúzia de filhos e geralmente uma ou duas avós ou uma tia velhinha e adoentada. As paredes exteriores de muitas das casas nem eram caiadas e até o interior de algumas cozinhas também era de pedra. Eram divididas em dois ou três compartimentos por meio dum frontal de madeira, ou, nalguns casos, até por cortinados de pano.
A cozinha era a parte maior, mais tosca, mais escura e também a maior da casa. Para além de cozinha servia de sala de jantar, sala para o serão e para as visitas, sala de banho, local de arrumos da lenha e das batatas e até servia para descascar e guardar o milho, sendo este dependurado nos tirantes do tecto. O seu tamanho, no entanto, reduzia-se bastante porquanto a maioria tinha dentro o forno e o lar.
Cada casa, geralmente, tinha duas portas sendo a porta de trás a mais utilizada no dia-a-dia e na faina diária. Muito escura durante a noite, nos longos serões de Inverno, a cozinha era tremulamente iluminada por uma candeia com um pavio de pano alimentado a enxúndia de galinha. A maioria não tinha chaminé, saindo o fumo por entre as telhas, sem no entanto muito dele, antes de sair, encher a cozinha pintando-a de tisna.
O compartimento central, chamado sala ou casa de fora, onde se recebiam as visitas importantes e o Senhor Espírito Santo, era também utilizado como dormitório dos filhos, geralmente dos rapazes, amontoados em uma ou duas enxergas, muitas vezes deitados ao travessar a fim de caberem todos. Finalmente o quarto, a divisão mais pequena, com duas camas, uma para o casal outra para as filhas e para a avó velhinha. Era também no quarto que se guardava a roupa domingueira e entre as camas era colocado o berço.
Em frente à porta de trás da cozinha, quase todas as casas tinham um pátio, que geralmente servia para albergar os chiqueiros do porco e das galinhas. O andar de baixo ou loja também estava divido: uma parte era destinada a guardar o gado, enquanto a outra servia para arrumos e de nitreira.
Carlos Fagundes
Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».
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