quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

«Brumas e Escarpas» #14

O ciclo do milho na Fajã Grande, nos anos 50

Parte VI – A “revolução” da caliveira

Nos finais da década de 1950 surgiu na Fajã a “caliveira” a qual veio alterar significativamente, poder-se-á mesmo dizer que veio revolucionar, a cultura do milho, nomeadamente a forma de o semear e a maneira de o sachar.

A “caliveira” era uma espécie de sachador, puxado apenas por um animal, geralmente um burro ou um macho, que tinha uma armação de forma triangular, sustentada à frente por uma roda, como o arado de ferro e à qual se seguiam séries de um, dois e três dentes com o formato de enxadas, de tal forma dispostos que os de trás passavam por onde não tinham passado os da frente, permitindo assim revolver toda a terra por onde a caliveira passava e que era conduzida por uma rabiça de duas pegas. Destinava-se a sachar o milho, revirando a terra com os dentes e, simultaneamente, arrancando as ervas daninhas. Por essa razão a forma de semear o milho foi substancialmente alterada: os regos passaram a ser rigorosamente paralelos uns aos outros e sempre no cumprimento do terreno, o milho passou a ser semeado um rego sim e dois não de forma a que, quando crescesse, a caliveira e o animal que a puxava pudessem passar por uma espécie de carreiro rectilíneo que ficava entre cada um dos dois regos semeados. Idêntico procedimento era tido nas cabeceiras do terreno.

A caliveira, no entanto, tinha vantagens mas também tinha desvantagens. No que concerne às primeiras, a caliveira aliviava o cansativo trabalho de andar vergado ao sacho dias e dias e, além disso, era bastante mais rápida. No entanto, tinha alguns malefícios o que levou alguns agricultores a teimarem em não a adaptar aos seus terrenos: obrigava a semear o milho em linhas paralelas muito alinhadas e equidistantes o que não era fácil devido à morfologia das terras, destruía muito do milho já crescido, quer por parte do animal, apesar de andar com uma boquilha, quer ao virar a caliveira nos extremos ou até mesmo ou não conduzi-la correctamente. Além disso a caliveira não sachava nem os cantos nem junto aos pés de milho, nem muito menos puxava a terra para junto dos pés deste, obrigando assim, que após o calivar, fosse necessário sachar grande parte do terreno e puxar a terra para junto dos pés de milho. Além disso as caliveiras eram bastante caras e só os lavradores um pouco mais abastados as podiam comprar, embora alguns destes as emprestassem aos que as não tinham por não as poder comprar. Assim acontecia com meu pai e meus irmãos que, por razões económicas, nunca tiveram caliveira mas sacharam sempre o seu milho com uma que lhes emprestava tio José Teodósio, que morava mesmo ali, em frente a uma terra que tínhamos na Fontinha.


Carlos Fagundes

Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».

2 comentários:

Anónimo disse...

Cada vez que eu me lembro destas sachadeiras, do cheiro da junça, da burra espantada, do frio da terra nos pés descalços e dos almoços que nos esperavam, com açordas de alho, com pão de milho e chicharro seco todos os dias, eu, que já ando pelos 60, penso:nem que me arrastassem eu queria voltar atrás.

Anónimo disse...

não querias voltar atrás mas estamos a caminho de voltar a trás para se comer aquelas sopas de couves nabos funcho agora comer charos secos todos os dias esta é uma grande mentira sopa de agrião, era comida de saude. agora querem é comer cachoros ambergues por isso há cancros e não é de beber agua nos tubos de fibro-cimento como dizia um anónimo aqui.toda a vida se bebeu agua nestes canos e nunca nada aconteceu.