sábado, 16 de junho de 2012

«Brumas e Escarpas» #43

O pátio em frente à minha casa

A minha casa era pobre e muito pequenina, mas era a minha casa e eu gostava muito dela porque tinha poucas coisas, é verdade, mas tinha uma que eu adorava e que um dia me tiraram. A minha casa tinha um pátio em frente, do lado que dava para o caminho.

Era um pátio simples e humilde, mas grande e murado com pedras toscas que o separavam da rua, com a qual comunicava através de dois portões sempre abertos, um em frente à porta da sala e outro em frente à porta da cozinha.

O meu pátio era muito importante para mim porque era nele que eu brincava, era nele que eu me sentava a ver passar as pessoas e era nele que eu me escondia quando fazia jogos com os meus amigos de infância. Mas o meu pátio também era importante para a minha mãe porque era nele que ela punha a roupa a coarar, era nele que ela plantava sécias e cubres e o enchia de flores e também era a ele que ela assomava quando passava uma vizinha ou uma amiga para lhe dar dois dedos de conversa. O meu pátio era importante para o meu pai, mas mesmo muito importante, porque era lá, na parte superior, junto à porta da cozinha que ele colocava molhos e carradas de lenha que trazia das terras para acender o lume e aquecer o forno e onde havia um enorme cepo, sobre o qual, com um machado, ele cortava e rachava toda aquela lenha e era nele que, à tardinha, fruindo duma bela sombra, se sentava a descansar das pesadas lides do campo. O meu pátio era muito importante para todos nós porque nele havia, em frente à janela da sala, uma enorme “japoneira”, sempre muito verde, a proporcionar-nos uma sombra muito fresquinha, que na Primavera se enchia de flores vermelhas e que, quando se cansava delas, as atirava ao chão formando, ao seu redor, um tapete fofo, brilhante e colorido. O meu pátio era útil, necessário, belo e meu, mas... em frente dele não passavam automóveis.

Um dia abriram uma estrada para que começassem a passar automóveis por ali mas... destruíram completamente o meu pátio, arrancaram-lhe todas as flores, cortaram a “japoneira” e, pior do que isso, obrigaram a minha mãe a ir coarar a roupa para a Ribeira, o meu pai a colocar a lenha bem longe dali e eu a ir brincar para debaixo do estaleiro.


Carlos Fagundes

Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».

4 comentários:

Anónimo disse...

Todos nós tivemos "Pátios" nas nossas vidas que por uma qualquer razão deixaram de existir.
Fica-nos a lembrança enquanto por cá andarmos.

Anónimo disse...

Pouco tinhamos quando eramos crianças e ainda nos tiravam parte desse pouco.

Anónimo disse...

Não conheço o Senhor Fagundes mas aqui relata coisas muito importantes da minha época.Um pátio era muito importante em frente ou atrás da casa para tude incluindo na altura de amarrar o milho. È lindo haver quem recorde com a sua escrita novelas do passado para que os novos vejam em nós como a vida era dura para se viver. Muito bem Senhor Fagundes eu acompanho todas as suas crónicas

Carlos Fagundes disse...

Obviamente que também não o conheço, mas fico-lhe muito grato pelas suas palavras. É bom e motivador ter leitores assim.