«Brumas e Escarpas» #111
A primitiva administração das ilhas das Flores e do Corvo
A administração local das Flores e do Corvo não diferia da que vigorava nas outras ilhas.
Segundo o historiador Oliveira Marques, a incorporação da Capitania da ilha das Flores e do Corvo na Coroa, em consequência do arresto dos bens do último capitão-donatário, o duque de Aveiro, não trouxe grandes benefícios para a população das mais isoladas ilhas do arquipélago açoriano.
Segundo um outro historiador, o padre António Cordeiro, o governo das duas ilhas esteve sempre unido desde a constituição da Capitania, altura em que o dono daquelas duas ilhas era Guilherme da Silveira. No entanto, os condes de Santa Cruz, nomeados comendadores das duas ilhas, é que recebiam a dízima de ambas, obtendo assim amplos proventos. Também frei Diogo das Chagas afirma que as duas ilhas foram colocadas desde os primórdios do seu povoamento sob jurisdição comum. A jurisdição suprema das ilhas, imediatamente a seguir à jurisdição real, cabia ao capitão-donatário. Pedro da Fonseca terá sido o primeiro administrador das duas ilhas que passou a intitular-se capitão das Flores e senhor do Corvo.
Nas Flores, o representante ou lugar-tenente do capitão-donatário era o ouvidor das sentenças. Embora não fosse um cargo vitalício nem hereditário, era um cargo que provinha do sistema da administração judicial instituído no Reino, tanto nas terras sob jurisdição da Coroa como nos senhorios. No início os ouvidores eram providos de três em três anos com a função de exercer a justiça em nome do rei. Era a eles que o povo recorria nos seus problemas e nas suas contendas; como diz o padre António Cordeiro “nas Flores em tudo há recurso para o ouvidor”.
O primeiro ouvidor das Flores foi Gomes Dias Rodovalho, o fundador da freguesia da Fajã Grande. O capitão Pedro da Fonseca nomeou-o seu lugar-tenente, capitão-mor e ouvidor.
As Câmaras das vilas de Santa Cruz e das Lajens repartiam entre si a jurisdição concelhia da ilha das Flores, demarcando-se a norte pela Ribeira das Casas e a sul pela Ribeira da Silva. A Santa Cruz pertenciam Ponta Delgada, Cedros, Ponta, Caveira e Lomba, e ainda o lugar do Corvo. À vila das Lajens pertenciam a Fajãzinha, Fajã Grande, Lajedo e outras povoações menores.
O governo militar das duas ilhas estava entregue a dois capitães-mores, um em cada vila, autónomos entre si e sem subordinação a alguém na ilha, segundo o padre António Cordeiro. Subordinados a esses dois capitães-mores havia os capitães das companhias de ordenança que governavam os alferes e estes os sargentos e mais cabos. No Corvo havia uma companhia e respetivo capitão.
A defesa das duas ilhas dependia apenas desta gente (mais de 1500 homens de armas nas Flores e mais de 200 no Corvo), que não possuía mais do que armas antigas – espadas, adagas, lanças e alguns arcabuzes “ao estylo de Portugal antigo” – e da vantagem dos “impenetráveis muros das suas rochas ao mar”, reforçada pela “artilharia horrenda dos penedos, que pelas altas rochas lanção abayxo” para afastar os navios hostis. Não existia nas Flores qualquer fortaleza, soldadesca paga ou peças de artilharia.
Carlos Fagundes
Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».
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