domingo, 13 de outubro de 2013

Enfrentar a mudança e reinventar ilhas

É essencial compreender que, mesmo com um passado difícil (emigração massiva, isolamento), subsiste sempre um potencial que permite fazer evoluir as ilhas para lógicas renovadas. A questão hoje é saber como usar as heranças do passado, para criar novas dinâmicas e um futuro positivo para as comunidades insulares.

As ilhas mudam. É uma realidade, e é uma realidade que não deixa ninguém indiferente. Quer seja para espalhar a saudade duma idade de ouro, ou então promover as virtudes do progresso, todos os temas são válidos para pôr em relevo a mudança.

Mas falar de ilhas é tocar no emocional, no imaginário e no sonho. Parece que existe uma “ilha” que vive nas mentes, mas cuja imagem não encaixa com a realidade. E então, como usar essa ilha sonhada que vive em nós, no inconsciente colectivo, para reinventar e valorizar as ilhas reais? Para criar e recriá-las à nossa maneira?

Uma parte da resposta chegou graças a uma pesquisa de quatro anos (de 2007 até 2011) ao estudar espaços insulares. É na área da Geografia Humana e Ambiente (que estuda a relação entre as sociedades humanas e o espaço onde vivem, neste caso as ilhas) e no quadro da Universidade francesa de La Rochelle, que foram percorridas as ilhas dos Açores (mais especificamente Pico, Flores e Santa Maria) e três ilhas do arquipélago das Hébridas, na Escócia. A ideia era perceber melhor a relação entre o passado dessas ilhas e a construção dum futuro mais equilibrado e sustentável.

No século XX houve mudanças essenciais que marcaram os espaços insulares (principalmente as ilhas integradas no seio da União Europeia, como os Açores), as quais tiveram consequências problemáticas, mas também emergiu uma progressiva tomada de consciência dos desequilíbrios criados.

É essencial compreender que, mesmo com um passado difícil (emigração massiva, isolamento), subsiste sempre um potencial que permite fazer evoluir as ilhas para lógicas renovadas. A questão hoje é saber como usar as heranças do passado, para criar novas dinâmicas e um futuro positivo para as comunidades insulares.

Esta pesquisa levou-nos a fazer mais de 200 inquéritos a açorianos, nativos ou novos residentes, para perceber como observaram essas mudanças ao longo dos anos, e como imaginam o futuro. Foram usadas imagens antigas e também criadas várias montagens fotográficas antes/após, para pôr em destaque as importantes mudanças vividas no arquipélago, na época contemporânea.

Através dos testemunhos e das leituras, apareceram então as grandes mutações que essas ilhas (Açores e Hébridas) tiveram que enfrentar durante o ultimo século: mudanças de ciclos económicos, emigração, entrada na União Europeia e na PAC, abertura ao Mundo com os transportes aéreos, chegada do turismo, conexão à Internet, entrada na era da protecção do ambiente... que vieram transformar totalmente a maneira de viver. O último século trouxe com ele as reviravoltas mais intensas que as ilhas conheceram em toda a sua História.

Neste início do século XXI temos a possibilidade de fazer emergir o que chamaremos a “reinvenção insular”. É fulcral tomar consciência dos limites ambientais das ilhas, e observar como são amplificadores de mudanças e reveladoras das lógicas mundiais actuais.

Além da pesquisa científica pura, o papel dos cientistas é também de propor novos tipos de desenvolvimento para esses espaços. Dessa investigação foram então destacadas nove ideias e propostas concretas para reinventar ilhas. Ideias tais como: valorizar a pluriactividade, apontar para a auto-suficiência alimentar ou adoptar a “fini(ati)tude”, cada uma dessas ideias sendo detalhada no escrito final.

Algumas dessas propostas podem ser aplicadas a todos os tipos de espaços insulares. Outras são mais difíceis de implementar a curto prazo, mas é sempre possível com uma vontade colectiva e individual forte. Começar a acreditar que a ilha sonhada corresponde a uma realidade tangível, permite dar vida a este sonho e criar ilhas de sonho.


Artigo de opinião de Nina Soulimant, na edição de 27 de Setembro do semanário «Mundo Açoriano». Nina Soulimant é natural de França e residente na ilha das Flores, sendo doutorada em Geografia e Ambiente.
Saudações florentinas!!

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