sábado, 6 de fevereiro de 2016

«Brumas e Escarpas» #96

Pás e varredouros

Na década de 1950, cozer pão era um hábito semanal em quase todas as casas da Fajã Grande. Geralmente cozia-se pão de milho, de vez em quando de trigo e, muito raramente, de mistura, feito com farinha daqueles dois cereais.

Para cozer pão eram necessários alguns meios e vários utensílios domésticos. Entre estes últimos destacavam-se as pás e os varredouros.

Quanto às pás, existiam geralmente duas em cada casa. Uma maior e mais grosseira ou tosca, destinada à cozedura do pão de milho e uma outra mais pequena, mais fina e de melhor qualidade, para o pão de trigo. As pás eram feitas de madeira e constituídas por duas partes: o cabo e a pá propriamente dita. As pás usadas na confeção do pão de milho eram, geralmente, de fabrico caseiro. Cada qual construía a sua pá. Para isso munia-se de uma comprida vara de madeira rija e cilíndrica, cortada nas terras de mato, que depois de seca era limpa de cascas e nós, na ponta da qual se pregava um pedaço de tábua, de forma arredondada. A parte da frente desta tábua, ou seja, a parte oposta ao cabo era afiada, como o gume de uma faca. Assim ficava mais fina, a fim de, por um lado, a padeira conseguir empurrá-la para baixo do pão cozido, pegando-lhe e retirando-o do forno com mais facilidade, mas também para, antes de cozido, o colocar no forno de forma adequada e no lugar que desejasse. A pá usada na cozedura do pão de trigo, bastante mais fina e leve, tinha forma semelhante, mas era constituída por uma peça única, também de madeira, sendo a pá uma continuidade do cabo. Estas pás, assim como muitas das usadas para o pão de milho eram feitas por carpinteiros. Havia vários na freguesia.

Por sua vez os varredouros, destinados a varrer o forno, eram sempre de fabrico artesanal, sendo geralmente a própria mulher que cozia o pão que os fabricava. Para tal necessitava de um pau ou vara semelhante ao cabo da pá. Depois amarrava-lhe numa das extremidades uma mancheia de ramos de árvore, recorrendo geralmente às que existiam mais à mão: faia-do-norte, loureiro, faia, sanguinho e, na ausência destes, a fetos ou cana roca. Havia também quem substituísse a verdura por umas tiras de pano, retiradas de roupas já não usadas, o que, embora tendo a vantagem de poder ser usado em várias cozeduras, exigia que estivesse constantemente a ser molhado em água para que o pano não ardesse.

Mas para além de varrer o forno e padejar o pão em cru ou já cozido, era necessário puxar as brasas para fora da porta, colocando-as amontoadas em cima de uma espécie de peanha que existia fora da porta, a fim de se manter por mais tempo o calor do forno. Essa difícil operação era efetuada com uma espécie de pá virada. Numa das pontas de um pau, igualmente semelhante ao cabo da pá ou do varredouro, era pregada uma tábua retangular, formando uma espécie de sacho e que, por vezes tinha uma outra finalidade: empurrar o pão já colocado no forno para se adequar mais o espaço aos que lá dentro ainda era necessário colocar.

Enfim... Trabalhos e esforços notáveis estes e muitos outros, os dos nossos antepassados.


Carlos Fagundes

Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».

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