Jornal «As Flores»: passagem de testemunho no fim de uma longa etapa
Hoje acordei e senti-me mais leve, logo depois de perceber que, ao contrário de ontem, já não era director de jornal. Já não tinha esta sensação de desanuviamento há muito mais de trinta anos!
Foi muito tempo.
Ao longo destes muito milhares de dias [como director de jornal] procurei fazer tudo o que pude ao serviço desta terra em particular, em prol dos Açores, por uma comunicação social livre, interventiva, verdadeira e corajosa.
Sempre soube que havia os que não gostavam disto ou daquilo; e até os que não gostavam de mim e logo nem sequer de nada. Sempre houve uns responsáveis duma ou doutra causa pública, que agora ou logo se lamentavam amargamente de algumas coisas que apareciam à luz! E lá iam pregando que eram tolices, mentiras, politiquices... Mas se não usaram o direito de resposta, é porque não podiam explicar; se não recorreram aos tribunais, é porque não tinham razão.
Os que não percebem, não podem gostar. Aos que não sabem fazer melhor, só resta “botar abaixo”. Aos que não tiveram coragem de discordar, às claras, do que escrevi, do que assinei e de tudo o que era publicado e como director publicamente assumi, de peito aberto, sem me esconder atrás de nada, restou-lhes ficarem no anonimato... mordiscando. Ou mais modernamente, ainda que se gabem de capacidades de discursar de improviso, parece que até se escondem debaixo de “blogues”!
Nada me afectou. Meu pai ensinara-me que eles nunca dão pontapés em cão morto.
Porque nunca me pagaram para escrever, nem escrevi para receber, as compensações que arrecadei e guardarei, foram sempre os elogios dos muitos que sentiram que eu dizia por eles e assim prestava um serviço público pela comunidade.
Sinto e quero expressar que se mérito houve nestas décadas de jornalismo, ele em muito se deveu à competente e empenhada cooperação de muitos colaboradores, tantos dos quais infelizmente já partiram deste mundo, a quem quero aqui homenagear e aos que estão vivos e alguns no activo, agradecer, muito reconhecido, o seu trabalho competente e gratuito.
Sei que não fui perfeito, nem o Jornal, sob a minha direcção, terá sido quanto poderia, porque não basta querer. Nem fiz ou disse tudo, porque não basta programar e investigar. Só receava – como os meus amigos sabem – perder o fôlego, a coragem, ou a lucidez, antes do fim da etapa. Graças a Deus que assim não foi. Terminei as funções de co-proprietário e de director de jornal, porque achei que era tempo. Terminei para dar lugar a outros e oportunidade de fazerem diferente, mais e melhor.
O mais importante era a continuação do Jornal. A então SubDirectora Maria José Sousa, com o gosto pela escrita que demonstra, a coragem pela intervenção social e a força da juventude – qualidades que levaram a que a investíssemos no cargo há meses – quase de imediato, aceitou o desafio público que havia sido lançado e mostrou-se interessada em encontrar forma de dar continuidade ao Jornal e das longas conversações realizadas resultou, da parte do Grupo de Amigos do Jornal As Flores, a concessão de todas as possíveis e variadas facilidades, a começar pela cedência gratuita do título.
Ligado a este projecto desde a sua fundação, em 7 de Dezembro de 1973 e com funções expressas de Director desde Outubro de 1975, cessei ontem essas responsabilidades (ainda que sem poder disfarçar a emoção, ao terminar uma missão executada com muita paixão) e passei o testemunho, no fim desta longa etapa.
Quero também, em meu nome e no do Rui Miguel Moura, agradecer a cooperação de todos os que contribuíram, por qualquer forma, para a concretização e manutenção do projecto e a excelente aceitação por parte da generalidade dos assinantes e leitores; e particularmente agradecer a dinâmica e generosidade dos anunciantes, essenciais na manutenção de um jornal, entre os quais – e como sempre – a excepção só serviu para confirmar a regra.
Deixamos também o nosso muito obrigado aos empregados que ao longo dos anos aqui trabalharam, em especial à Fátima Avelar Correia, que da empresa vem cuidando melhor do que se de coisa sua, ao longo destes últimos 20 anos; e às empresas onde o Jornal tem sido composto e impresso, ultimamente com a qualidade demonstrada pela Ferreira & Soares Lda.
Dos muitos jornais que se publicaram nas Flores, a I Série do “As Flores” durou 26 anos. O actual “As Flores” está no 35º ano.
Nesta hora quero afirmar também publicamente que desejo para o Jornal “AS FLORES” uma longa vida e um futuro do maior sucesso, sabendo que assim, para além do mais, se está cumprindo o maior desejo de Roque de Freitas Moura, o principal responsável pelo reaparecimento da imprensa escrita nas Flores, depois de um silêncio de uma década e meia.
Procurarei ajudar, a partir de agora como um colaborador entre os demais, porque aceitei o pedido que para tanto me fez a nova Directora; a exemplo aliás do que há muitos anos venho fazendo com vários jornais dos Açores.
Sei que a Maria José Sousa sabe e pode fazer um bom Jornal. Mas ela assumiu um desafio trabalhoso, absorvente e complexo. Ela assume a maior responsabilidade de uma causa que não é só dela, mas das Flores e dos Açores.
Se cada qual assumir a sua parte, maior será o sucesso.
E que Deus a ajude.
Fajã Grande – Flores, 15.02.2008
Renato Moura
Este artigo de opinião é parte integrante do jornal «As Flores», edição de 28 de Fevereiro de 2008.
4 comentários:
Apesar de muitas vezes não concordar com as opiniões de Renato Moura, este teve sempre a coragem de não se esconder e de assinar sempre a sua opinião, não caindo na tentação de mandar as pedras e esconder a mão.
Paulo Henriques
só no tempo em que teve no p.s.d. não atacou o partido para bem das flores.
pois não,mas passou a independente quando o governo do psd quis gozar com as flores...lol
Finalmente o sr. Renato caiu em si e viu que nunca mais será eleito para cargo nenhum nesta ilha. Apesar de por vezes parecer, ninguém esquece o passado.
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