«As ilhas serenas», de Fernanda Câncio
Não é só a paisagem poética, as brumas misturadas com Sol que pintam quadros de William Turner a toda a hora. Na linguagem política desgrenhada e cada vez mais insultuosa que faz o quotidiano do Continente (da Madeira nem falar), os Açores são uma surpresa. Estar numa campanha em que nunca se ouve, de nenhum dos contendores, uma acusação feia, um "mentiroso" ou "aldrabão", e na qual se percebe, de todos os partidos, disponibilidade para o diálogo (Berta Cabral chegou a admitir uma coligação com o PS, com o qual a CDU admite acordos parlamentares e o CDS praticamente se oferece em namoro) é algo de notável. E tanto mais o é quanto se trata, para PS e PSD, de uma disputa renhida. Que culmina na semana em que Passos Coelho - o mesmíssimo que anda há um ano e meio a acusar o PS de ter arruinado o país - interpelou o PCP no parlamento por usar a expressão "ladrão", considerando que se trata de "um apelo à violência".
Na verdade, se palavras duras houve nesta campanha, foram as dirigidas por Berta Cabral e o seu convidado especial Marcelo Rebelo de Sousa contra o Governo da República (como aqui é conhecido). Orelhas a arder nas regionais açorianas, só as de Passos. Mas sempre com contenção - aqui, o habitualmente picante Marcelo e o ainda mais truculento Marques Mendes não puseram o pé em ramo verde.
O motivo disto, que de resto o director da campanha socialista frisou ao «Diário de Notícias» - "Aqui quem faz ataques feios perde votos, as pessoas não gostam" - é um mistério a investigar. O mesmo país, dois sistemas: o do insulto, da calúnia e das campanhas negras, banalizado por Alberto João Jardim na Madeira e nos últimos anos pelo PSD continental, e o destas nove ilhas. Deviam exportar isto - pena é que talvez ninguém no país queira comprar.
Artigo de opinião da jornalista Fernanda Câncio, publicado (originalmente) no «Diário de Notícias» de ontem, dia 13 de Outubro.
Saudações florentinas!!
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