domingo, 26 de maio de 2013

As consequências da inacção

Sem políticas concretas e transversais a biodiversidade continuará a desaparecer. Podem existir dias como este [Dia da Internacional da Biodiversidade, 22 de Maio], que chamem a atenção para a conservação. São dias intensos, cheios de actividade, cidadania responsável, debates ou seminários. Mas na prática, se não existir legislação, medidas concretas para minimizar o impacto do Homem no planeta, estas intenções e boas acções de um dia esfumam-se sem consequências directas.

Nas últimas quatro décadas a Humanidade tem vindo a assistir a um crescimento demográfico e desenvolvimento económico e social como não há precedentes. O produto interno bruto (PIB) é o termo mágico que mede o crescimento económico e o desenvolvimento dos países. Como consequência, o planeta sofre uma permanente poluição, atmosférica e aquática, e uma exploração desenfreada de recursos naturais. Embora maior riqueza possa trazer melhores condições de desenvolvimento, não quer dizer que a qualidade de vida seja melhor. A exploração insustentável de recursos tem reflexos ao nível dos serviços do ecossistema e da biodiversidade e, por isso, da qualidade dos bens de que dependemos. Até onde estamos a hipotecar a sustentabilidade da Humanidade?

Mais biodiversidade, maior sustentabilidade do ecossistema, mais e melhores recursos disponíveis ao Homem. Nos Estados Unidos, um estudo elaborado pelo serviço nacional de florestas reconheceu existir uma relação entre pessoas mais saudáveis e a mancha arbórea natural em zonas urbanas ou limítrofes. Ou seja, os serviços do ecossistema, benéficos para a sociedade e base de uma vida sustentável, deviam ser contabilizados e entrar na quantificação da "medida" do PIB. Esta é uma das recomendações que a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) tem vindo a fazer. A sensibilização para estes assuntos foi promovida através do desenvolvimento do chamado índice better life que permite jogar com 11 parâmetros para definir, por país, a qualidade de vida das pessoas. Entre estes, no parâmetro ambiental, 20% dos portugueses dizem não ter acesso a áreas verdes ou espaços naturais, o que está acima da média da OCDE, de 12%.

Portugal tem uma vasta rede de áreas protegidas. Mais do que proteger é necessário gerir e conservar, não é apenas reservar, delimitar. A tradição mediterrânica pressupunha uma intervenção do Homem com a poda de ramos (para lareiras e fornos), com o fogo controlado (para rejuvenescimento e limpeza de matas) e com o pastoreio extensivo, mas não intensivo. Hoje, o abandono destas práticas, por razões óbvias inerentes ao desenvolvimento, está a ter repercussões que só mais tarde - e já tarde - a sociedade entenderá. O declínio de montados, por exemplo, não é mais do que a resposta de uma sequência de alterações impostas durante anos a um ecossistema que estava em perfeito equilíbrio harmonioso. O problema em todas estas situações é a falta de observação holística e por isso tratam-se maleitas sem se atender às suas causas.

Cada vez mais a conservação da biodiversidade é um problema cadente e pendente que deve ser entendido e tratado de forma global. As ferramentas políticas são várias e diversas. Podiam ser mais estimuladas as parcerias do tipo Business&Biodiversity onde estão inscritas, apenas, 64 empresas. Outras podiam juntar-se se existissem incentivos competitivos de sustentabilidade ambiental. Mas para além da cooperação institucional e interministerial, das ligações e incentivos empresariais podem e devem aparecer iniciativas descentralizadas ligadas à sociedade. Não é de mais enaltecer o papel das associações não governamentais que, com a sua voz e o saber dos seus membros, têm contribuído para uma cidadania em prol do ambiente. No entanto, a sociedade devia ser mais activa e menos permissiva a situações de impacto no território. Não é por acaso que a participação pública dos portugueses nas avaliações da OCDE são muito abaixo da média. Apesar do papel das sociedades científicas e das organizações não governamentais, falta promover, dentro da sociedade, o que os ingleses têm muito: amadores, naturalistas, autodidactas, ouvidos e respeitados por cientistas e políticos. Quando isso acontecer teremos mais cidadania, responsável e mais activa em prol da sustentabilidade dos ecossistemas. Então sim, poderemos celebrar o dia da conservação da biodiversidade.


Artigo de opinião da professora universitária Maria Amélia Martins-Loução, publicado no jornal «Público» de 22 de Maio.
Perfaz hoje quatro anos que a ilha das Flores passou a integrar a Rede mundial de Reservas da Biosfera da UNESCO.
Saudações florentinas!!

2 comentários:

Anónimo disse...

Ficamos todos muito sentidos.
A nossa homenagem.
http://www.youtube.com/watch?v=--sDBQuz6DY

Anónimo disse...

será que já chegou às flores o cabo de fibra é que eu estou a ver que este cabo leva mais tempo do faial às flores do que levou o cabo de europa américa.