O ciclo do milho na Fajã Grande, nos anos 50
Parte IX – Pendurar no estaleiro
Era nos estaleiros que se guardava o milho, quer os cambulhões em que as maçarocas tinham a casca quer as cambulhadas em que as maçarocas eram encambulhadas descascadas. O milho ali ficava a secar desde o dia da apanha até à altura em que fosse necessário levá-lo para o moinho, a fim de o transformar em farinha.
Construídos sempre muito perto das casas, geralmente num quintal, numa courela ou até no curral das galinhas, os estaleiros na Fajã Grande tinham quatro formas diferentes. Uns, os maiores que eram também os mais comuns e usuais, tinham a forma de um telhado de casa acentuadamente inclinado, assente sobre grossos barrotes de madeira, as faces laterais constituídas por tiras ou “taliscas” de madeira, paralelas umas às outras, em forma de grade e pregadas aos paus das arestas e a outros que as subdividiam em duas ou três partes. Era nesta tiras que se penduravam com arte e sabedoria os cambulhões cujas maçarocas tinham casca, e que ficavam de tal maneira expostos de maneira que a chuva não penetrasse e atingisse as maçarocas e os ventos ciclónicos do Inverno não levassem o próprio milho pelos ares. Apenas as faces das cabeceiras e a da base não tinham tiras pelo que ficavam abertas a fim de que o ar circulasse por entre as espigas e estas não deteriorassem ou apodrecessem. No interior também eram pregadas tiras paralelas à base onde se penduravam as cambulhadas, ou seja o milho descascado. A armação destes estaleiros assentava em quatro ou seis pés, todos de alvenaria caiada e muito lisos a fim de evitar a subida dos ratos.
Havia outros estaleiros muito semelhantes a estes no tamanho mas em forma de cubo, assente em cima de quatro pés, semelhantes aos outros. Os cambulhões com casca eram pendurados nas quatro faces laterais, ficando abertas, para entrada do ar, a base e a parte superior. Estes estaleiros eram raros.
Outro tipo de estaleiros, mais simples e mais pequenos eram os formados apenas por quatro paus. Estes eram enfiados na terra, equidistantes uns dos outros mas de tal maneira inclinados que se juntavam na parte superior sendo então amarrados com um forte arame, formando uma espécie de pirâmide cujas faces também eram cravejadas de tiras paralelas, nas quais eram pendurados os cambulhões, quer com casca quer sem casca. A protecção contra os ratos obtinha-se através da colocação de umas folhas de lata no cimo dos pés. Estes estaleiros eram de construção esporádica e normalmente eram construídos quando o milho não cabia no estaleiro principal.
Finalmente e construídos pelas pessoas que tinham pouco milho, havia uns estaleiros muito mais simples e constituídos por quatro ou cinco paus paralelos uns aos outros e nos quais se pregavam as ripas, formando uma espécie de grade que se encostava geralmente às empenas das casas e onde se penduravam os cambulhões.
Pendurar o milho nos estaleiros era uma arte e exigia sabedoria e experiência. Os cambulhões começavam a pendurar-se de baixo para cima, umas maçarocas ficavam viradas para fora e outras para dentro, formando uma espécie de cobertura de telhado até chegar à trolha, ou seja, aresta oposta a base e que tinha que ser muito bem coberta, sendo para tal elaborados uns cambulhões maiores.
Carlos Fagundes
Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».