domingo, 29 de maio de 2016

«Brumas e Escarpas» #106

O lugar dos Paus Brancos

O pau-branco é uma árvore endémica açoriana, existente em todas as ilhas do arquipélago exceto na Graciosa. Atinge os oito metros de altura, tem folhas lanceoladas a ovaladas, com flores brancas e frutos de tom azulado escuro, semelhantes aos da oliveira, árvore a cuja família pertence, mas curiosamente a oliveira não vegeta nos Açores. A sua madeira é muito apreciada e utilizada sobretudo no fabrico de móveis.

Cuida-se que no início do povoamento o pau-branco, que se desenvolve juntamente com o incenso e a faia, existiria em grande quantidade nas ilhas açorianas. No entanto, com o início da colonização, as zonas mais soalheiras e de melhor terreno foram assoreadas dando origem a terrenos agrícolas para cultivo dos cereais ou a pastagens para a criação de gado, o que provocou um enorme desbaste da mancha florestal primitiva. As espécies menos resistentes, como o pau-branco, foram as mais prejudicadas. Atualmente, dado o abandono de muitos campos agrícolas e pastagens, as espécies mais persistentes como a faia e sobretudo o incenso são as mais privilegiadas e protegidas pela natureza. A ampla plantação, no século passado, de outras espécies, com destaque para a acácia e sobretudo para a criptoméria, também terão contribuído para o lento desaparecimento de algumas endémicas, entre as quais o pau-branco.

No entanto ficou a sua memória e, sobretudo, a sua marca indelével na toponímia de muitas localidades. Foi o que aconteceu na Fajã Grande, freguesia que entre os seus variadíssimos lugares, possuía um com o nome de Paus Brancos.

O lugar dos Paus Brancos situava-se na parte sul da freguesia, próximo da chamada zona da Lagoinha ou Alagoinha, paredes meias com a Rocha. Era um amplo espaço onde existiam três tipos de propriedades: algumas terras de mato, onde proliferavam incensos, faias, loureiros, sanguinhos, entrelaçados entre fetos e cana roca, uma outra lagoa e várias relvas. As lagoas eram terrenos onde, desmesuradamente, crescia a erva. E onde existiam os inhames de água. No entanto, como eram inundadas com a água que descia quer da Ribeira dos Paus Brancos quer das várias grotas que proliferavam na Rocha, eram terrenos muito alagadiços, o que fazia com que a erva crescesse de tal modo que, com alguma frequência, era ceifada e acarretada aos molhos para os palheiros sobretudo para alimentação das vacas leiteiras.

Formando uma ampla planície e protegido dos ventos pela Rocha e pelo Pico Agudo que lhe ficava em frente, o lugar dos Paus Brancos, assim como a sua vizinha Alagoinha, era muito fértil e de excelentes pastagens, pese embora se situasse já nos contrafortes da Rocha que, neste lugar era extramente firme, hirta e segura, pois ali não havia derrocadas ou ribanceiras e geralmente não caíam pedras. A Rocha, apesar da água que por ela descia, era tão firme que através dela, havia sido, em tempos idos, construída uma vereda que dava acesso às relvas do mato, nomeadamente às do Rochão do Junco, do Rochão Grande, do Serrado Velho e do Rochão Tamusgo que lhe ficavam sobranceiros.

O lugar dos Paus Brancos a leste fazia fronteira com a Rocha do mesmo nome, a norte com a Alagoinha de Baixo, a oeste com o caminho e com o Pico Agudo e a Sul com a Alagoinha de Cima e com Mateus Pires. O acesso às propriedades fazia-se através de uma canada que se iniciava no enorme largo do Pico Agudo, onde havia um descansadouro.

A origem deste topónimo é de fácil e simples explicação. Decerto que provinha do facto de ali existirem inicialmente muitos paus-brancos que aos poucos terão desaparecido devido ao arroteamento e transformação de algumas terras de mato em pastagens e lagoas e, mais tarde, devido à plantação de criptomérias.


Carlos Fagundes

Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».

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