sábado, 22 de agosto de 2015

«Brumas e Escarpas» #89

Crendices fajãgrandenses

Muitas eram as crenças ou crendices existentes entre a população da Fajã Grande, e muito provavelmente nas outras freguesias da ilha das Flores, nos anos 1950. Tratava-se, naturalmente, de espécies de sentenças muito antigas, algumas trazidas muito possivelmente pelos primeiros povoadores e que se foram transmitindo de geração em geração. Aqui se recordam algumas, sendo que se trata apenas de meras citações de memória.

No ano 2000 acabava o mundo.
Comer salsa em jejum ajudava a desenvolver a memória.
Atirar sal para o lume espantava o azar.
Passar debaixo duma escada dava má sorte.
Quebrar um espelho, dava sete anos de azar.
Quem trabalhasse no primeiro dia do ano trabalhava todos os dias.
Era pecado cuspir depois de comungar.
Sol com chuva casavam-se as viúvas.
Uma vassoura atrás da porta espantava as visitas.
Quando fazia relâmpagos deviam-se esconder ou tapar os espelhos.
Apontar uma estrela fazia nascer verrugas no dedo que apontasse.
Saltar por cima duma criança impedia-a de crescer.
As raparigas não deviam comer ovos de duas gemas, pois teriam gémeos.
Encontrar ou cruzar com um gato preto, na rua, dava azar.
Quando o arco-íris virasse de pernas para o ar seria o fim do mundo.
Não se devia cantar durante a Quaresma.
Uma cruz feita em cima da massa do pão, acompanhada da oração – São João t’afermente e Santo Antonho t’acrescente – fazia levedar o pão mais depressa.
Sexta-feira 13 era dia de azar, pelo que não se devia mudar de casa, casar, mudar o gado, fazer o canteiro, semear milho, etc.
Agosto era mês de desgosto.
A língua do porco não se devia comer, devia ser oferecida pelas almas do purgatório.
Assobiar à meia-noite chamava o diabo.
Havia um “Calhau das Feiticeiras” onde existiam marcas dos pés delas, pois por ali desciam e subiam para atirar o corpo de Ti’Antonico por lá abaixo.
Na Sexta-Feira Santa era bom comer funcho. Nossa Senhora também comera a caminho do Calvário.
Onde os caminhos formavam cruzeiros colocava-se uma cruz.
As crianças que se portassem mal seriam assentadas no Boiceiro, uma cadeira com o fundo do assento repleto de pregos virados com o bico para cima.
Assistir à missa, confessar-se e comungar em nove sextas-feiras seguidas era garantia de não se morrer em pecado mortal.
Fazer uma cruz de cuspo no peito do pé melhorava o pé dorido.
O Senhor Espírito Santo era vingativo.

E muitas outras...

Carlos Fagundes

Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».

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