«Brumas e Escarpas» #107
O curral das galinhas
Na Fajã Grande, na década de 1950, não havia casa que não tivesse um curral de galinhas. Até a do senhor padre Pimentel, assim como em todas as outras casas mais abastadas. É que as galinhas tinham um papel de relevo na alimentação, não apenas pela carne mas sobretudo pelos ovos. Além disso o custo da sua alimentação era fácil e barato, uma vez que eram alimentadas com milho que abundava na freguesia mas também com ervas e verduras, nomeadamente com erva-santa e ainda com o farelo que sobrava do peneirar da farinha. Ao farelo juntava-se água, fazia-se uma massa a que se adicionava, por vezes, couves cortadas, cascas de batatas picadas ou outras sobras de comida, a fim de que o cardápio das ditas cujas ficasse mais suculento.
As galinhas eram criadas num curral, construído para o efeito junto de casa. O curral era um pequeno espaço, geralmente retirado à courela da porta. Era murado com paredes bastante altas, muitas vezes encimadas com arame farpado ou rede porque as atrevidas das galinhas se não fossem piadas ou se não tivessem as asas amarradas ou cortadas, saltavam cá para fora e iam pôr os ovos onde bem entendessem. Depois era o diabo para os encontrar. Além disso esgaravatavam e davam cabo das colheitas por ali existentes. Os currais, geralmente, situavam-se junto ao pátio traseiro de cada casa, cuja parte inferior havia sido transformada em poleiro. Este era uma pequena concavidade escura, tendo a um canto o linheiro, devidamente preparado para elas porem os ovos. Nos currais mais afastados do pátio contruíram-se poleiros de madeira, ou seja, pequenos casotos ou encravados na aba duma parede, ou até colocados no meio do curral. Havia quem aproveitasse este espaço para nele construir o estaleiro.
No entanto, quem tinha hortas, por entre as terras de mato, tapava-lhes bem as paredes, amarrava e cosia as asas às galinhas e soltava-as na horta, com a dupla vantagem de lhes retirar as ervas daninhas e de lhes ir lançando algum estrume. Nas hortas também se construía o poleiro, ou adaptando uma furna ali existente ou construindo um de madeira, semelhante aos dos currais. Por vezes um cesto velho, deitado, também servia de poleiro. Mas, neste caso surgia um pequeno problema. É que as atrevidas das galinhas apanhando-se à solta decidiam pôr os ovos onde bem queriam e entendiam, aqui e além, muito escondidinhos e mudando de sítio em cada dia, o que obrigava os donos a uma tarefa árdua, incómoda, demorada e por vezes improfícua para lhes descobrir os esconderijos. Era costume, para evitar tal estouvado procedimento, deixar-lhes um ovo no linheiro inicial ou um objeto que imitasse um ovo e assim as parvas das galinhas, cuidando cada uma que ele era seu, iam à vez lá desovar os restantes.
Na verdade, por incrível que pareça, os currais das galinhas, apesar de simples e modestas construções, tiveram um importante papel na economia e sobretudo na alimentação da população fajãgrandense.
Carlos Fagundes
Este artigo foi (originalmente) publicado no «Pico da Vigia».
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